Quase três anos e eu ainda sinto falta de tanta coisa. E nem falo das pessoas que fui perdendo, a saudade doendo e eu esquecendo de lembrar pra ver se não machuca tanto. Falo daquilo que a gente nem nota no dia a dia. Sinto falta das minhas esquinas. Das minhas certezas: padaria, emergência, bar. Dos meus problemas: trânsito, varrer pó de asfalto, lado do sol. Dos meus intervalos: dragão, barraca da tia, jonas. Quero os atalhos: onde cobrir um botão, onde comprar papel laminado, onde consertar uma bolsa. Quero o beco da poeira. Quero cerveja entregue em domicílio. E colos à vontade. Sinto falta do cheiro do café que eu ainda ia fazer.
Quero me sentir na minha. Quero deitar encolhida e saber que a minha dor tem canto certo. Quero gargalhar na janela e ouvir o eco. Quero os percursos conhecidos. Quero as ruas desconhecidas, mas já tão minhas antes mesmo de chegar lá. Quero me saber em detalhes e desconhecer em partes iguais. Quero me chatear. Não quero ser estranha na minha cidade, não quero pegar uma rua e descobrir que está em obras já faz tempo. E eu não sabia. Eu quero saber. Quero minhas livrarias, aquelas em que eu já sei onde deixei cada livro que quero comprar. Quero os sebos, poeira enchendo meus olhos de espanto e descobertas. Quero sentir que sou estrangeira em meu lugar, mas de uma forma íntima e cúmplice. Quero me sentir na palma da mão.
Eu sei que eu sou a própria mão. Eu sei que eu sou minha própria casa. Eu sei que o cheiro conhecido é o meu. Eu sei que só eu sou meu fim da estrada. Eu sei que sou meus pontos de referência, minhas placas, minhas esquinas íntimas. Eu sei. Mas e daí? Não se faz uma canja com um saber. Não se gela uma cerveja com um saber. Não se sente um abraço com um saber. Um saber não é uma língua outra na minha boca. Um saber não é o barulho de carros lá em baixo e nem o riso de gente conhecida cá na sala. Um saber não é.
* Texto feito a pedido de uma pessoa muito especial, na qual foi pedido que eu escrevesse descrevendo tudo que sentir.
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